O Representante Permanente de Belarus perguntou sobre a liberdade de expressão
22 janeiro 2021 | TUT.BY
Por iniciativa da Estônia, França, Irlanda, Noruega, Grã-Bretanha e Estados Unidos, o Conselho de Segurança realizou uma reunião informal com a participação da ex-candidata à presidência Sviatlana Tsikhanouskaya. Na reunião, foram discutidas questões da mídia em Belarus.
Irene Khan, Relatora Especial da ONU sobre Liberdade de Expressão e Opinião, dirigiu-se aos participantes com um discurso. Segundo ela, a liberdade de divulgar informações e trocar opiniões é um dos principais direitos humanos violados em Belarus.
De acordo com a Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, mais de 400 jornalistas foram presos no ano passado e a mídia independente está sujeita a várias restrições. Ela também mencionou o desligamento da internet em agosto de 2020, bem como a revogação de credenciamentos para mais de duas dezenas de jornalistas estrangeiros. Khan não ignorou o caso de nossa colega Katsiaryna Barysievitch.
“Uma jornalista supostamente está em prisão preventiva por divulgar informações médicas confidenciais e informações falsas, enquanto na verdade, ela estava investigando a morte violenta de um manifestante pacífico. O jornalismo está sendo criminalizado. Por um lado, nem um único ataque a um jornalista foi investigado ou analisado em tribunal. Por outro lado, toda a força da lei criminal recaiu sobre os jornalistas e a mídia.”
Ela pediu ao governo de Belarus que permita que o Relator Especial da ONU para Belarus e ela própria visitem o país.
Tsikhanouskaya pediu à ONU que convoque uma reunião do Conselho de Segurança e inclua Belarus na agenda
Sviatlana Tsikhanouskaya lembrou sobre as repressões que se seguiram às eleições presidenciais em Belarus. As repressões se aplicaram não apenas a manifestantes pacíficos, mas também às jornalistas que cobriram esses eventos.
“Entre elas estão três jornalistas destemidas – Daria Tchultsova, Katsiaryna Andreeva e Katsiaryna Barysevitch, que estão presas há dois meses. Elas foram acusadas de organizar protestos em massa e divulgar informações médicas sobre o manifestante Raman Bandarenka, que foi morto por associados do regime. Elas são culpadas apenas por fazer seu trabalho e dizer a verdade,” declarou ela.
Tsikhanouskaya também observou que os meios de comunicação governados pelo regime são apenas parte do quadro geral das repressões em Belarus.
“Mais de 32.000 pessoas foram detidas, cerca de 900 pessoas são suspeitas em processos criminais com motivação política, 400 casos de tortura relatados pela ONU e 8 ativistas que morreram por causa da violência estatal. Nenhum funcionário do governo foi processado. Apesar desta violência, o povo belarusso continua a protestar diariamente. Ele demonstra coragem, dignidade e resiliência,” adicionou Tsikhanouskaya.
Latushka voltou-se para seus ex-colegas: “Isso é uma lei ou uma violação da lei?”
Pavel Latushka, em seu discurso, afirmou que as repressões em Belarus afetaram todas as camadas da sociedade belarussa: mulheres, estudantes, médicos, atletas, cientistas, atores, músicos, etc.
“Mesmo as pessoas mais vulneráveis são punidas simplesmente por exercerem seus direitos humanos universais – como mostra o exemplo de Lizaveta Bursava. Uma avó sobrevivente do Holocausto de 87 anos foi considerada culpada de uma ‘ação em massa não autorizada’ por pendurar a antiga bandeira nacional em sua varanda. Devemos agradecer à mídia independente por sua cobertura deste e de muitos outros casos. Aqui, devemos mais uma vez expressar nosso apoio e solidariedade às jornalistas presas ilegalmente Daria Tchultsova, Katsiaryna Andreieva, Katsiaryna Barysevitch, o blogueiro Ihar Losik e outras 185 pessoas que são consideradas presos políticos,” disse Latushka.
Ele também fez seis perguntas a seus ex-colegas – diplomatas belarussos.
“Primeiro. Vimos as gravações de vídeo de assassinatos premeditados em Belarus. Não há nenhuma investigação iniciada. Isso é uma lei ou uma violação da lei? Segundo. Milhares de pessoas foram torturadas. Apelos com evidências de vídeo foram enviados. Novamente – nem uma única investigação foi iniciada. Isso é uma lei ou uma violação da lei? Terceiro. Mais de 32.000 detenções e aprisionamentos. Esta é uma parte marginal da sociedade? Quarto. 500 jornalistas foram detidos e presos. Não foram 5, mas 500 pessoas! Isso é liberdade de expressão? Nove (na verdade, já são dez – Nota de TUT.BY) jornalistas estão agora na prisão. Quinto. O jornalista cobre encontros nas ruas e por participar deles é mandado para a prisão. Jornalistas pararam de usar jaquetas com a palavra ‘imprensa’ nas costas porque estão sendo baleados em extermínio Sexto. O vice-ministro das Relações Interiores Karpiankou na gravação de áudio dá ordem de atirar para matar, atirar no rosto. Eu preciso comentar sobre isso?” perguntou Latushka. “Talvez meu ex-colega Rybakou (Representante Permanente de Belarus na ONU – Nota de TUT.BY) vai explicar ao mundo que tudo isso está dentro da estrutura da Declaração dos Direitos Humanos?”
Ivashkevitch: “Desde setembro, os jornalistas se tornaram o principal alvo das forças de segurança”
O funcionário do canal de TV Belsat Stanislau Ivashkevitch, que atua no jornalismo investigativo, mas trabalhou como repórter durante os eventos de agosto, também fez um pronunciamento na reunião.
Segundo ele, foi detido duas vezes e cada vez passou dois dias sob custódia e foi condenado a multa.
“Nos meus primeiros dois dias na prisão em agosto, fomos retirados da cela para espancamentos. Tivemos que correr por um corredor de guardas mascarados e cada um deles batia em nós.”
Ivashkevitch disse que as agressões continuaram no pátio, onde os detidos estavam de joelhos e com as mãos na nuca. Depois, segundo ele, não viu mais nenhuma crueldade, porém, sua colega Alena Shtcharbinskaya, que foi detida no dia seguinte, foi espancada e constantemente humilhada pelos guardas e passou seis dias no hospital. Ele também mencionou o incidente de sua colega ser ferida por uma bala de borracha, embora ela usasse um colete azul de jornalista, e um incidente semelhante com Natallia Lubneuskaya, uma correspondente de Nasha Niva.
Ele disse que desde setembro os jornalistas se tornaram o principal alvo das forças de segurança. Eles não foram apenas detidos, mas também os seus equipamentos foram danificados. Ivashkevitch citou os dados da Associação de Jornalistas de Belarus: foram registrados casos de uso de força contra 62 jornalistas, quase 500 foram detidos e cerca de 100 foram submetidos a prisão administrativa. Segundo ele, cerca de 50 recursos informativos da Internet em Belarus foram bloqueados no ano passado e os credenciamentos de mídia foram cancelados. Ele também chamou a atenção para a greve de fome do blogueiro Ihar Losik.
Brown: “Minha experiência como jornalista em Belarus, o país pelo qual me apaixonei, terminou amargamente”
O jornalista britânico Gareth Brown contou que nos últimos cinco anos cobriu eventos no exterior, em pontos críticos, no Iraque durante o confronto com o ISIS, e também entrevistou chefes de estado e de governo. Ele não podia trabalhar legalmente em nosso país [Belarus] e receber o credenciamento, mas chegou a Belarus para contar sobre os acontecimentos.
“Havia esperança de mudança em todo o país. No entanto, ela enfrentou a dura realidade do governo autoritário. Em Belarus, passei mais tempo fugindo do tiroteio do que em qualquer um dos seis pontos quentes onde estive como repórter.”
Brown se comparou a um fugitivo da justiça: escondeu suas anotações, escondeu sua origem. Segundo ele, o jornalista que cobre os protestos em Belarus está classificado como manifestante. Ele descreveu as várias dificuldades que enfrentou em nosso país [Belarus], e também chamou a atenção para o fato de que familiares de jornalistas também são perseguidos.
“Minha experiência como jornalista em Belarus, um país pelo qual me apaixonei depois de passar um tempo lá, terminou amargamente – dois homens a paisana me espancaram nas escadas tarde da noite. Não tenho dúvidas de que eram da KGB. Mas quando me encostei no concreto, recebendo socos de seus punhos e joelhos, não me arrependi de nada.”
Rinkēvičs considera necessário criar um órgão internacional para investigar as violações dos direitos humanos em Belarus
O ministro das Relações Exteriores da Letônia Edgars Rinkēvičs também citou estatísticas da Associação de Jornalistas de Belarus sobre detenções e perseguições de jornalistas, censura e bloqueio de recursos da Internet.
“A situação em Belarus continua a nos preocupar, assim como, provavelmente, preocupa a toda a comunidade internacional. Quase seis meses se passaram desde as eleições presidenciais em Belarus, mas as mais graves violações de direitos humanos continuam. Isso inclui detenção ilegal, tortura física e mental. Os jornalistas estão entre os que mais sofrem. Eles pagam o preço pela coragem em apresentar a verdade.”
Ele observou que o governo da Letônia continua a fornecer apoio aos jornalistas independentes de Belarus, está envolvido na sua reabilitação e assistência psicológica, e também fornece apoio financeiro à sociedade civil de Belarus. A Letônia, disse ele, apoia o relatório da OSCE, que descreve as violações dos direitos humanos em Belarus, e disse que o país espera o relatório do Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos sobre a situação em Belarus, que será publicado em fevereiro.
O próximo passo, em sua opinião, deveria ser a criação de um órgão internacional para investigar as violações dos direitos humanos em Belarus – ele apelou a todos os países do Conselho para apoiarem a sua criação.
Representante da Federação da Rússia: “A reunião é uma provocação clara”
O representante da Rússia Dmitriy Polianskiy disse que falaria por mais tempo do que o limite estabelecido para contrabalançar a abordagem politizada e unilateral dos oradores anteriores.
“Belarus não está na agenda do Conselho de Segurança que não está discutindo a situação neste país. Assim, a reunião de hoje é uma clara provocação e uma tentativa flagrante de interferir nos assuntos internos de um Estado soberano. Também fiquei impressionado com a forma como o lado estoniano resumiu os resultados da reunião, sem nem mesmo ouvir todos os membros do Conselho de Segurança e da própria Belarus. Isso demonstra claramente que vocês não precisam de uma discussão aberta sobre este tópico, mas sim de uma ilusão de unidade internacional e um coro de países com ideias semelhantes,” disse Polianskiy.
Ele também perguntou ao lado estoniano se eles estão, deliberadamente, criando um precedente para discutir, no Conselho de Segurança, a situação interna de um país que não ameaça a segurança internacional de forma alguma. Ele comparou as situações em Belarus e nos Estados Unidos, traçando alguns paralelos, e perguntou se vale a pena discutir a situação nos Estados Unidos.
Polianskiy acusou a oposição belarussa de financiamento aberto do exterior e de convocação a maiores distúrbios por meio de redes sociais e até mesmo de assassinatos de funcionários de segurança e suas famílias.
“Além disso, os países ocidentais financiam e apoiam abertamente alguns meios de comunicação belarussos. Ouvimos muitas confirmações disso hoje. Será que vocês não entendem que esse apoio rouba a independência deles e os transforma em seus porta-vozes?”
Representante de Belarus: “Nenhum de vocês é um farol brilhante da democracia”
O Representante Permanente de Belarus na ONU Valianstin Rybakou também fez seu pronunciamento na reunião. Ele observou que tais reuniões, mesmo as não oficiais, nada têm a ver com a agenda do Conselho de Segurança da ONU e a participação de Belarus nesta reunião não é um reconhecimento da sua legitimidade.
“Esta é outra tentativa desesperada de vários membros do Conselho de Segurança de ganhar pontos políticos com uma abordagem seletiva e tendenciosa. Isso é claramente indicado pela forma como esta reunião é organizada. Alguns apresentadores e palestrantes não são profissionais de mídia. Alguns não têm nada a ver com jornalismo. De acordo com a lógica dos patrocinadores do evento, desta forma qualquer pessoa pode se apresentar como um profissional de mídia capaz de falar com competência sobre o tema,” disse Rybakou.
Ele contou que a delegação belarussa apelou aos organizadores com uma proposta de dar uma oportunidade de falar no evento de hoje para representantes da mídia (o presidente da União de Jornalistas de Belarus [pró-governo] Andrei Kryvasheyeu, e o analista pró-governo Aliaksandr Shpakouski – Nota de TUT.BY), mas eles tiveram sua participação negada.
“Os patrocinadores deste evento devem ser avisados. Nenhum de vocês é portador do padrão de valores e princípios democráticos. Nenhum de vocês é um farol brilhante da democracia. Vocês não têm absolutamente nenhum direito moral de pregar a democracia ou ensinar valores democráticos para nós ou para quaisquer outras pessoas. Aliás, talvez os contribuintes europeus e estonianos tenham interesse em saber quem pagou a viagem de alguns palestrantes a Tallinn,” enfatizou o representante permanente de Belarus na ONU. “O que Belarus menos precisa agora é de intervenção e instrução estrangeira, especialmente daqueles que estão longe dos padrões de liberdade de imprensa e de expressão.”
Valiantsin Rybakou mais uma vez exprimiu a posição de Minsk: Belarus não tolerará qualquer interferência e pressão externa e está pronta para cooperar com cada Estado-Membro nos princípios de respeito mútuo e diálogo.
“Preocupação” e “assuntos internos de Belarus”
Representantes de diferentes países também falaram na reunião informal.
Representantes da Finlândia, Grã-Bretanha, Polônia, Irlanda, Lituânia, Alemanha, Noruega, Ucrânia, EUA, Bélgica, Canadá, França, Estônia, Romênia, Eslovênia, Eslováquia, Itália, Tchéquia, Montenegro, Áustria, Austrália, Malta, Croácia e Portugal expressaram preocupação com a situação da liberdade de expressão em Belarus e a perseguição de jornalistas em nosso país.
A importância da liberdade de expressão e de opiniões foi destacada pelo México e pela Índia.
O representante da RPC lembrou que a China respeita a soberania, a independência e a integridade territorial de Belarus. Ele expressou confiança de que a estabilidade política e social em Belarus será restaurada sob a liderança do presidente Aliaksandr Lukashenka e com a ajuda dos esforços dos próprios belarussos.
“A China considera o que está acontecendo em Belarus como um assunto interno e se opõe à interferência externa,” disse o diplomata.
O Representante Permanente da República Popular da China junto à ONU também perguntou como o assunto em discussão tinha a ver com a agenda do Conselho de Segurança da ONU e também lamentou que dois jornalistas belarussos não tenham tido a oportunidade de falar nesta reunião.
Encontro “Fórmula de Arria”
A reunião é realizada de acordo com a “Fórmula de Arria” – as reuniões neste formato não são realizadas na câmara do Conselho de Segurança, não elaboram quaisquer resoluções ou outros documentos oficiais. Outros membros do Conselho de Segurança da ONU, se desejarem, podem se recusar a participar da reunião.
Esta é a segunda reunião do Conselho de Segurança da ONU com a participação de Tsikhanouskaya. A primeira foi em 4 de setembro e, naquela reunião, ela pediu a introdução de sanções contra os envolvidos em violações dos direitos humanos em Belarus e a tomada de medidas para conter a violência.
De acordo com um relatório recente da Repórteres Sem Fronteiras, Belarus confirmou sua condição de país mais perigoso da Europa para jornalistas. De de acordo com a Associação de Jornalistas de Belarus, pelo menos 480 jornalistas foram detidos, 97 jornalistas cumpriram prisão administrativa, 10 jornalistas estão atualmente na prisão.